O panorama é pobre, pensa-se.
Já foi melhor, pensa-se.
Parece estar a dar sinais de reanimar, pensa-se.
Quando se fala do panorama das revistas de Teatro cai-se invariavelmente nestes tópicos cépticos de conversa. Se pensarmos bem, nas últimas três ou quatro décadas, nada mudou. Aqui e nos outros países. Em países como A França e a Alemanha, com tradições teatrais fortes, escolas e estudos universitários dedicados ao Teatro, companhias estáveis, centros culturais que programam Teatro por todo o país, sim, aí existem revistas de Teatro de referência. Mas poucas e não isentas de problemas (veja-se o percurso da Théâtre/Public).
Em Portugal o panorama sempre foi paupérrimo e assim continua, mas parece dar sinais de reanimar…
No entanto, as revistas de teatro são instrumentos de análise do fenómeno teatral e de diálogo com a prática, são antenas de actualidade viradas para o mundo, testemunham processos e experiências, seleccionam e fornecem informações a quem faz, mas também a quem critica, a quem investiga, a quem estuda, e alimentam a curiosidade intelectual do espectador, pelo menos do espectador informado e sensível ao fenómeno artístico que gostaríamos de ter.
O problema que se coloca à cabeça é o da estabilidade destes projectos editoriais. Como evitar a brevidade e a precariedade destas experiências que, normalmente, sucumbem entre o terceiro e o vigésimo número, ou caem numa rotina cinzenta sem chegar a criar uma rede de difusão nem o reconhecimento generalizado do sector teatral?
Quando aparecerá um projecto com estrutura e com os níveis de dedicação necessários para conseguir manter regularidade e interesse durante um período longo de afirmação? Porque são projectos lentos, estes. Não existe em Portugal e no Brasil qualquer projecto de revista mensal, bimestral ou sequer trimestral que possa acompanhar de perto o Teatro que se faz, através de um balanço equilibrado entre a informação e a reflexão.
O aparecimento, no ano passado, de uma nova revista, a Sinais de cena, dá-nos, no entanto, um bom motivo para celebrar. A revista é semestral e parte dos núcleos universitários ligados ao ensino de Teatro e Literatura. A fórmula associativa criada para a edição, juntando o Centro de Estudos Artísticos da Faculdade de Letras de Lisboa a uma editora (a Campo das Letras) e à Associação Portuguesa de Críticos de Teatro, parece garantir algumas condições básicas para uma fórmula bem sucedida e os dois primeiros números são de grande qualidade e diversidade. Para celebrar o acontecimento pedimos um artigo à sua directora, Maria Helena Serôdio.
Portugal
Sinais de cena junta-se, assim, à revista Artistas Unidos, da responsabilidade da Companhia com o mesmo nome e a colaboração da editora Cotovia, também semestral.
Esta revista publica-se com regularidade desde 1999. Sublinhemos esta regularidade. Ainda por cima trata-se de uma regularidade generosa que nos tem propiciado números especiais com dramaturgias de vários países – Escócia, Holanda, Itália. Cada edição inclui pelo menos um texto inédito para teatro e dossiers vários à volta dos espectáculos que a companhia vai montando.
A Adágio, publicada desde 1990, não é exclusivamente dedicada ao Teatro, definindo-se como “revista de arte e cultura”, embora o seu local de origem, o Centro Dramático de Évora, lhe tenha impresso desde o início uma clara predominância teatral. Deu-nos alguns números de grande qualidade e revela uma notável persistência: o último número editado é duplo (36/37) e desenvolve um dossier sobre Fuenteovejuna, peça que a companhia montou; está no prelo o nº 38/39 e o CENDREV anuncia um outro número para Outubro.
“A revista Adágio continua a ser editada no ritmo que nos é possível, em função do quadro financeiro do CENDREV”, diz-nos José Russo da direcção da companhia.
A Setepalcos, editada desde 1995 pela Cena Lusófona, não tem periodicidade definida, surge perante a oportunidade de um tema mobilizador e tem privilegiado abordagens panorâmicas do teatro que se faz nos vários países de língua portuguesa – Moçambique, Brasil – assim como na Região Autónoma da Galiza. O último número, de 2003, é exclusivamente dedicado ao Teatro Galego.
Dois jornais, mais informativos, complementam o quadro das publicações de Teatro: o jornal Duas Colunas editado pelo Teatro Nacional de S. João, desde 2003, com uma regularidade habitualmente mensal, que desenvolve, no essencial os tópicos da programação do TNSJ; e este cenaberta que pretende estar virado para a ideia de intercâmbio na CPLP e ser um elo de ligação entre a comunidade teatral.
Brasil
Conhece-se menos, daqui, a realidade brasileira neste campo. Mas os depoimentos que solicitámos (e para os quais remetemos) a Silvana Garcia, Aimar Labaki, Armindo Bião e outros não revelam grandes novidades neste sector das revistas. À parte o fenómeno da deslocação da reflexão para as de carácter universitário, onde os Departamentos de Mestrado e Pós-Graduação em Teatro alimentam belos exemplos de revistas em S. Paulo (Sala Preta), em Salvador (Repertório), no Rio de Janeiro (Percevejo) e em Santa Catarina (Urdimento).
Destacamos entre estas a Sala Preta, da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da Universidade de S. Paulo, modelo de revista anual publicada desde 2001. Pretende tornar-se semestral a partir deste ano. A revista acolhe jovens ensaístas e investigadores, a par de outros nomes mais consagrados, que pertencem ou não ao corpo docente da Escola, mas sempre dedica dossiers a montagens teatrais ou percursos de trabalho que vai seleccionando do conjunto da produção teatral.
No número quatro, respeitante ao ano de 2004, a Sala Preta ensaia “aprofundar a investigação das fronteiras entre as artes contemporâneas e a exploração de seus respectivos territórios” e conta com a colaboração de, entre outros, Flora Süssekind, Márcio Aurélio, Mariângela Alves de Lima, Newton Moreno (dramaturgo de quem se publica uma das suas últimas obras, Agreste), e uma entrevista com a cenógrafa Daniela Thomas.
Os outros títulos que se devem assinalar são experiências ligadas a grupos de teatro: a Folhetim (do Teatro do Pequeno Gesto), a Vintém (da Companhia do Latão), os Cadernos do Folias (da Companhia Folias d’Arte) e a Subtexto (do Galpão).
Tirando esta última, que surgiu em Agosto do ano passado e que pretende ser anual, mas da qual ainda não é possível traçar um perfil, as outras têm já um percurso e uma coerência que resulta da ligação ao trabalho teatral desenvolvido por cada companhia, como destacam Labaki e Silvana Garcia.
A revista Folhetim, dirigida por Fátima Saadi, destaca-se neste panorama pela sua regularidade e pela atenção à actualidade teatral brasileira. A revista, publicada desde 1998, é semestral e, no último número (nº20), inclui uma extensa entrevista com Antônio Araújo do Teatro da Vertigem.
Cabo Verde
De todos os outros países de língua portuguesa apenas Cabo Verde edita uma revista de Teatro – a Mindelact. Editada pela associação Mindelact, que também organiza um festival anual com o mesmo nome, a revista é ex-pressão de um amplo movimento teatral que, desde meados da década de noventa, se gerou na cidade do Mindelo, ilha de S. Vicente.
O primeiro número da revista Mindelact apareceu em 1997 e o número mais recente (14/15) foi lançado já este ano. Pelo caminho a revista tem dado notícias pormenorizadas das várias edições do festival e, em geral, das actividades teatrais em Cabo Verde. Organiza dossiers variados sobre temas teatrais e editou em 2003 um número especial (13) com pequenos textos dramáticos inéditos de seis autores caboverdianos.
Galiza
Na Galiza, a RGT (Revista Galega de Teatro), dirigida por Antón Lamapereira e editada pela associação “Entre Bambalinas”, é a mais regular publicação de Teatro da Galiza e publica-se desde 1995. O último número (n.º41 – Inverno de 2004) traz, como é habitual, uma peça de teatro – “Terra pelo médio”, de Ernesto Caballero -, publica um relatório sobre a Rede Galega de Teatro, um artigo de Carlos Carvalheiro sobre o grupo português Fatias de Cá (a revista tenta estabelecer ligações ao teatro português), entrevistas com Krystian Lupa e Juschka Weigel e noticiário variado sobre a actividade teatral galega.
A revista Bululú, de teatro de títeres, editada pelo Centro de Documentación das Artes Escenicas e Musicais de Galicia (IGAEM), publicou-se até 2003 (n.º5). A sua directora, Mar Nogueira, informa-nos que a publicação foi interrompida e não é certo que recomece.
Entretanto, a Associación de Actores, Directores e Técnicos de Escena de Galicia vai publicando uma interessante edição entre a revista e a newsletter, que já vai no número 17 (a periodicidade é quadrimestral) sob o título Escaramuza.
Na Corunha, a fechar este quadro galego, CasaHamlet, revista com o mesmo nome da escola de teatro que a edita, ambas dirigidas por Manoel Lourenzo, nome histórico do teatro galego, é um título anual que se regista desde 1999.